Entenda porque o governo deverá estender benefício para veículos novos.
Retomada do crédito e queda da Selic também beneficiam o setor.
O mistério do governo sobre a prorrogação da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para veículos novos mais uma vez gera euforia no mercado. Como aconteceu no final de março — antes de o benefício ser estendido por mais três meses — as concessionárias estão cheias de clientes que temem o fim do desconto, enquanto representantes do setor e consultores insistem no mesmo discurso: continuar com a redução significa manter o nível de emprego na indústria.
O receio das demissões reforça o posicionamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que nos últimos dias tenta entrar em acordo com a sua equipe econômica sobre os rumos do setor. As possibilidades são a redução gradativa, a manutenção ou o fim do benefício. Segundo Lula, a decisão do governo será anunciada na próxima segunda-feira (29).
Na análise do coordenador do MBA na área de consultoria da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Ulysses Reis, a retirada do desconto teria como efeito a redução do nível produtivo, o que acarretaria no aumento do desemprego. “Isso não vai atingir somente as montadoras, vai ser um efeito em cadeia, que atingirá o setor de autopeças, financiamento, produção de insumos como plástico, aço, metais e assim por diante”, explica Reis. Atualmente, as montadoras empregam diretamente 120,4 mil pessoas.
O coordenador da FGV reforça que os meses tradicionalmente ruins para o varejo começam em agosto e só se recuperam em dezembro, ou seja, mesmo com o benefício mantido, o movimento das concessionárias pode cair por causa da sazonalidade. “Manter o IPI reduzido até fevereiro seria importante. Além disso, entre janeiro e fevereiro os consumidores usam o 13º salário. Temos de ter a consciência de que a crise não acabou”, destaca.
O presidente da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), Sérgio Reze, afirma que o setor não tem nenhum sinal de qual será a posição tomada pelo governo, mas acredita que se a redução for mantida, a indústria automobilística nacional superará o ano de 2008 em vendas. Segundo ele, até agora as concessionárias não precisaram demitir funcionários, ao contrário, elas contratam. “Não demitimos em nenhum momento, inclusive, a procura por vendedores só tem aumentado”, diz Reze.
Compensar queda das exportações
Para o sócio-diretor da Trevisan Consultoria e especialista no setor automobilístico, Olivier Gerard, o desconto sobre o IPI deveria ser mantido até 2010, para garantir estabilidade ao setor. O especialista explica, que historicamente a indústria automobilística nacional “vive em pulos”. Ou porque o mercado interno não está aquecido ou por causa da retração do mercado externo. Entretanto, a crise atual força a queda tanto das vendas no Brasil quanto em outros países. Assim, a manutenção do IPI cria ambiente para o consumidor adquirir o veículo novo e, assim, estimular as vendas internas.
“Mercados como o europeu, japonês e norte-americano vão ficar parados até o segundo semestre de 2010. Se voltar a alíquota antiga de IPI, sem se preocupar com o mercado externo, há grande possibilidade de o mercado interno parar de vender e as montadoras não ter fuga nas exportações. Seria o pior dos mundos. Isso vai gerar desemprego na certa”, reforça Gerard.
Arrecadação
Enganam-se aqueles que pensam que o governo perdeu arrecadação com a redução do IPI para os veículos. Entre 20 de dezembro do ano passado e 13 de março deste ano – o primeiro período da medida — o governo ganhou R$ 551 milhões a mais em arrecadação devido ao aumento do volume de vendas de automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus.
Segundo estudo feito pela Fenabrave, Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças), a arrecadação de IPI foi de R$ 748 milhões com a cobrança reduzida, entretanto, o volume de veículos emplacados compensou pela arrecadação de Programa de Integração Social (PIS), Contribuição Para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA). Sem a redução, o IPI renderia aos cofres públicos R$ 1,340 bilhão.
Os dados atualizados sobre a arrecadação ainda não foram divulgados pelas entidades.
Redução das taxas e retomada do crédito
Encarar a redução do IPI como a única “salvação” da indústria automobilística é um erro na visão dos especialistas, mas também a manutenção do benefício não significa a formação de uma "bolha nas vendas". O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Miguel Jorge, argumenta ser contra a prorrogação do desconto do imposto por acreditar que ele vá perder o impacto sobre o consumo.
Embora a medida tenha “estancado” a crise, tanto o governo quanto a Associação Nacional de Veículos Automotores (Anfavea) reconhecem a importância da retomada do crédito, a queda da taxa básica de juros (Selic), a manutenção baixa do nível de inadimplência e os novos investimentos da indústria previstos entre este ano e 2010.
E as notícias para o setor são positivas em relação à melhora das condições de financiamento. De acordo com o diretor de relações institucionais da Associação Nacional de Veículos Automotores (Anfavea), Ademar Cantero, daqui pelo menos três meses é que os consumidores sentirão a redução da Selic nos planos de financiamento. Segundo ele, a queda das taxas e a retomada do crédito em nível semelhante ao anterior à crise, ajudarão a reaquecer o setor. Isso se a inadimplência continuar “controlada”.
“A tendência é de termos progressiva melhoria a partir da queda da Selic, entretanto, esperamos que o spread bancário, que é a margem de risco do banco, caia também, mas isso depende do nível de inadimplência”, observa Cantero.
Segundo o diretor da Anfavea, as montadoras que anunciaram novos investimentos no Brasil mantêm os planos. Afinal, além de os investimentos serem planejados para longo prazo, quem investe durante a crise, colhe frutos quando o mercado retoma o ritmo.
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